Você já ouvir falar do Escritor Cliché?
O Escritor Cliché escreve pensando exclusivamente em seu umbigo.
Nada contra, afinal trata-se de um grande mercado. Alguns umbigos costumam ser maiores que o território russo.
O Escritor Cliché acredita que o talento na escrita está subordinado ao sofrimento e à dor.
Ele idealiza o ato de escrever.
É preciso ser uma criatura solitária quase fantasmagórica que padece diante do papel em branco na busca pelo transcender das fronteiras dos significados e da expressão do humano através das letras.
– “Hábitos de escrita?”
– “As algemas do homem livre?” – cita Bierce.
O Escritor Cliché escreve apenas em horários em que a Inspiração – aquela coisa que brota tal qual uma espinha ou uma verruga, como diria David Martín – permite que isto aconteça.
– “Promover o livro?”
– “Imperialista!”
Em seu dicionário de sinônimos estão riscadas as palavras arame, bagalho, bufunfa, calique, cobre, fanfa, gaita, grana, massaroca, mussuruco, parrolo, pasta, pataco, pilim, teca, tostão, tutu, zerzulho…
Em sua humilde opinião, marketing é uma baboseira insignificante, coisa de capitalista sete-peles…
Ele costuma sair do sério (alguns tornam-se até agressivos!) quando a conversa mistura arte e comércio, pois o “escritor de verdade” deve chafurdar e perecer na miséria.
– “É preciso tomar muito cuidado com o viés mercadológico!” – conclama com espuma no canto da boca.
Para o Escritor Cliché, não existe alma viva neste Universo que escreva melhor do que ele.
Nem morto, nem vivo, tampouco no purgatório.
Ele é um literato raro que vive pela insigne arte de escrever por escrever, sem ânsia de ser lido.
O Escritor Cliché costuma ser um juiz pretensioso.
Sonha com uma literatura imaculada, ariana, onde somente aqueles que possuem o verdadeiro dom podem realmente se meter com a ciência da letradura.
Para ele, prática e aprimoramento são artifícios dos amadores e dos curiosos.
Enquanto você fica aí estudando escrita criativa, escrita analítica, ele já vomitava sentenças requintadas no útero.
– “Vida saudável?”
– “Faire passer cette coupe loin de moi!”
Ser artista requer a companhia de uma garrafa de Vodka e do Marlboro filtro vermelho, afinal foi assim que ele aprendeu nos filmes.
O Escritor Cliché se esquece que a primeira lição que todo escritor precisa aprender é fugir dos clichés.
Ele nem imagina o que é ser um…
Escritor Singular
O Escritor Singular é movido por todos os sentimentos e não somente pela dor.
Ele não vê problema algum em conjugar escrever e vender na mesma frase.
Afinal, escritores precisam de “clientes” tanto quanto médicos e engenheiros.
Para ele, não existe o termo “arte comercial”.
Prefere “servir”, pois escreve pensando nos outros e não apenas no rei (ou rainha) que habita em seu pandulho.
O Escritor Singular escreve todos os dias e, como Picasso, cuida para que a inspiração o encontre sempre trabalhando.
Como Veríssimo, ele também tem certeza de que a musa do escritor é o prazo.
Por conta disto, busca a organização de seu tempo e a produtividade em sua escrita.
O Escritor Singular não teme críticas, não se angustia com os julgamentos e seu foco é transformar quem o lê em uma pessoa melhor do que era antes de abrir seu livro, seja instruindo ou entretendo.
Ele cuida da mente, está sempre aberto para novos aprendizados, e cuida do corpo, templo de seu espírito e criatividade.
Antes disto, ele acredita que o saber, as experiências, as vivências, os aprendizados de cada um precisam ser compartilhados e não ruminados como se fosse um favor arrancado das entranhas.
O Escritor cliché acha que está no negócio de escrever.
O Escritor Singular sabe que além da escrita, ele também está no negócio do marketing.
Com qual deles você se identifica?
1 comentário em “O Escritor Cliché”
Muito bom mesmo, conheço alguns do lado de cá do Atlântico que dizem até que em Portugal só se escreve porcaria, menos os livros deles claro. Parabéns pelo artigo.