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Anatomia de um Best-Seller: Parte I – Tema

Dos romances de estreia aos clássicos eternos, podemos definir uma escala para os livros que vão de areia na praia a tatuagem na pele.

O que faz um livro transcender o simples ato de contar uma história e marcar um leitor para sempre?

O que torna um livro Best-Seller, amado por milhões de pessoas no mundo inteiro?

Qualquer tentativa de simplificar essa resposta é vã.

O sucesso literário envolve uma combinação de elementos, muito além de uma trama bem elaborada ou de personagens carismáticos.

Começo hoje uma série em que pretendo explorar os ingredientes de um Best-Seller, qualidades intangíveis, mas que resultam em leitores engajados e querendo mais.

Não vou chegar ao ponto de inserir 20 mil livros em um supercomputador, como fizeram Jodie Archer e Matthew L. Jockers, o que resultou no altamente recomendado “O Segredo do BestSeller – Tudo o que você precisa saber para escrever um livro campeão de vendas”.

O algoritmo que criaram é capaz de prever se o livro será bem-vendido em 80% dos casos.

Nada mal, né?

Nos últimos 12 anos, como autor e como editor na Casa do Escritor, tenho estudado a fundo as características que fazem com que livros caiam no gosto popular.

Nesta série, vou trazer para você 10 ingredientes que tornam livros inesquecíveis com exemplos e dicas práticas para você aprimorar sua escrita.

E o primeiro grande aprendizado que quero compartilhar com você é…

“Temas Universais Podem Transformar uma Boa História em um Clássico”

O tema de uma obra de ficção é sua ideia central ou seu entendimento principal. 

Para descobrir o tema, o leitor deve perguntar que visão de vida a obra apoia ou que percepção sobre a vida no mundo real ela revela.

Histórias baseadas em enredo são divertidas, mas não passam disso.

O tema é a cola para uma história inesquecível.

Frequentemente, uma obra de ficção implica algumas ideias sobre a natureza de todos os homens e mulheres ou sobre o relacionamento dos seres humanos entre si ou com o universo. 

Esses são chamados de temas universais.

Esse temas permitem que a obra transcenda tempo e espaço, tornando-a relevante para leitores de diferentes culturas e gerações.

Eis alguns temas universais:

  • A dor do Amor
  • O confronto de um ser humano com a natureza.
  • A falta de humanidade de um ser humano.
  • O confronto de um ser humano rebelde com uma sociedade hostil.
  • A luta de um indivíduo em direção ao entendimento, consciência e/ou esclarecimento espiritual.
  • O conflito de um indivíduo entre paixão e responsabilidade.
  • A glorificação humana do passado / rejeição do passado.
  • A tensão entre o ideal e o real.
  • Conflito entre seres humanos e máquinas.
  • O impacto do passado no presente.
  • A inevitabilidade do destino.
  • O mal da ambição desenfreada.
  • A luta pela igualdade.
  • A perda da inocência / desilusão da idade adulta.
  • O conflito entre pais e filhos.
  • O choque entre civilização e natureza selvagem.
  • O choque entre aparência e realidade.
  • Os perigos ou recompensas do carpe diem (aproveite o dia).

No livro de Jodie e Matthew, o supercomputador literário apontou que a presença de relacionamentos, profissão e tecnologia em um livro aumenta a possibilidade dele conquistar mais leitores.

Ao abordar esses temas, você tem a oportunidade de criar uma história que não apenas entretém, mas que também provoca reflexões profundas e, em alguns casos, mudam perspectivas.

Nunca se esqueça: transformar é a chave.

E quando você muda um leitor para melhor, você o transforma.

Vamos então ver algumas estratégias para isso.

A primeira delas é a autenticidade, ou seja, o tratamento do tema precisa ser realista e não abordado de forma simplista ou clichê.

Isso requer uma pesquisa prévia profunda, que lhe dará um entendimento mais profundo e permitirá que você trate o tema com a nuance que ele merece.

Apresente o tema sob diferentes pontos de vista via personagens ou subtramas.

Evite o moralismo e a obviedade.

Em vez de fazer declarações morais óbvias ou didáticas, permita que o tema se manifeste através das ações e escolhas dos personagens e deixe os leitores chegarem às suas próprias conclusões.

Permita que o tema se desenvolva naturalmente ao longo da história, em vez de inseri-lo artificialmente.

Crie personagens, cenas, diálogos e cenários realistas, o que vai contribuir para que ele se manifeste de forma mais orgânica.

Por fim, trabalhe para subverter expectativas e estereótipos, em vez de se apoiar neles.

Isso não só torna sua história mais interessante, mas também dá mais credibilidade ao tema escolhido.

Isto posto, aqui vão dicas práticas de como fazer isso:

1. Identifique o tema que você deseja explorar

Liste os temas que você acha interessantes ou relevantes.

Escolha um que seja tanto significativo para você quanto potencialmente envolvente para os leitores.

Leia:  Anatomia de um Best-Seller: Parte IX – Relevância Sociocultural

Faça um Brainstorming de Ideias.

Anote conceitos ou questões relacionadas ao tema.

Isso ajudará você a entender diferentes ângulos e profundidades que podem ser explorados.

Determine o Escopo, ou seja, até que ponto você deseja abordar o tema.

É algo que será o foco principal da história ou um subtexto sutil?

E leia livros, artigos ou assista a vídeos que tratem do tema escolhido para obter uma compreensão mais completa e ideias para abordá-lo de maneira única.

Um clássico que aborda temas universais é “Orgulho e Preconceito”, de Jane Austen.

Embora situado nas restrições sociais da Inglaterra do século XIX, os temas de amor, classe social e mal-entendidos são tão relevantes hoje quanto eram na época de Austen.

O livro de Austen se encaixa no tema universal da dor do amor.

Da mesma forma, “O Sol é Para Todos”, tradução horrível de “To Kill a Mockingbird”, único livro da americana Harper Lee, conterrânea de Truman Capote.

Embora focado no racismo e nas complexidades morais do Sul dos EUA, aborda temas como justiça, inocência e humanidade que ressoam com leitores em todo o mundo.

O livro de Lee se encaixa no tema universal da luta pela igualdade.

Após definir o tema universal que abordará em sua história, o passo seguinte é…

2. Conecte a Premissa ao Tema

Faça um esboço básico da trama, identificando pontos onde o tema será particularmente relevante.

Pense em um gancho, uma linha de abertura ou situação inicial que introduza imediatamente o tema ou prefigure sua importância na história.

Os personagens principais de “Orgulho e Preconceito”, Elizabeth Bennet e Mr. Darcy, são moldados em torno dos temas do livro.

Elizabeth é forte e independente, desafiando as normas sociais, enquanto Darcy começa como um personagem orgulhoso e evolui ao longo da história.

Os conflitos e desafios que eles enfrentam, como as pressões sociais e familiares para encontrar um casamento apropriado, estão intrinsecamente ligados ao tema.

A afirmação inicial sobre a “verdade universalmente reconhecida” de que um homem solteiro e rico deve estar em busca de uma esposa, introduz imediatamente o casamento e as expectativas sociais como bases da trama.

33 maneiras de escrever histórias aclamadas pela crítica e adoradas pelos leitores.

Da mesma forma, “O Sol é Para Todos” apresenta uma premissa poderosa ao focar em uma jovem garota, Scout, que testemunha as injustiças raciais em sua cidade sulista.

O tema de racismo, inocência e moralidade é habilmente explorado através dos personagens de Scout e seu pai, Atticus Finch.

Scout começa como uma criança inocente e curiosa e se transforma ao entender a complexidade do mundo à sua volta.

Atticus, por sua vez, serve como um farol moral na história.

O julgamento de Tom Robinson, um homem negro falsamente acusado, é o principal conflito que reflete o tema do livro.

O gancho inicial, no qual Scout descreve como seu irmão Jem quebrou o braço, serve para prefigurar os temas de perda de inocência e injustiça que serão desenvolvidos.

Tanto no livro de Austen, quanto no de Lee, os arcos dos personagens, os conflitos e até mesmo os ganchos iniciais são cuidadosamente planejados para ressoar com os temas escolhidos.

Isso não apenas torna as histórias envolventes, mas também oferece uma exploração profunda e significativa dos temas abordados.

Use esses pontos como guias para desenvolver a história.

Porém, antes de mergulhar na escrita, busque validar sua premissa com algumas pessoas de confiança para ver se ela efetivamente comunica o tema e desperta o interesse.

Com tema e premissa definidos, o passo seguinte é pensar nos conflitos. Assim…

3. Conecte os Conflitos ao Tema

Identifique conflitos que sirvam como um espelho para o tema e incorpore esses conflitos nos momentos chave da trama.

Utilize conflitos secundários que ecoem o tema principal e mantenha o tema em foco, evitando resoluções de conflito que o minimizem.

Como já vimos, o conflito central entre Elizabeth Bennet e Mr. Darcy gira em torno do orgulho de classe social e dos preconceitos associados ao casamento.

Esses conflitos não são apenas obstáculos externos.

Eles também são reflexos internos dos personagens e suas crenças.

Por exemplo, o orgulho de Mr. Darcy em sua posição social e o preconceito de Elizabeth contra ele por causa disso são elementos essenciais que impulsionam a trama e destacam o tema do livro sobre classe e casamento.

Já no livro de Harper Lee, o julgamento de Tom Robinson é o conflito explícito que reflete o tema subjacente de racismo e injustiça social.

O papel de Atticus Finch como defensor de Tom Robinson e as reações da comunidade a essa decisão criam conflitos que estão diretamente ligados ao tema.

Leia:  9 Dicas Para Escrever Diálogos Espetaculares

Além disso, Scout enfrenta seus próprios conflitos internos ao tentar compreender essas injustiças, o que a ajuda a crescer e a entender os temas mais profundos da história.

Um ponto importante a se destacar é que, em ambos, os conflitos não são apenas eventos plotados para criar tensão.

Eles são manifestações dos temas que os autores querem explorar.

Os conflitos são tão fundamentais para a narrativa que, se fossem removidos, os temas também desapareceriam ou seriam diminuídos.

Isso exemplifica a importância de criar conflitos que estejam intrinsecamente ligados ao tema da história.

Veja bem, o tema deve estar intrinsecamente ligado ao enredo e aos personagens, e não apenas como uma reflexão tardia.

Finalmente, enquanto o tema pode ser universal, a abordagem deve ser única.

Isso ajuda a manter o interesse do leitor e oferece novas perspectivas sobre um tópico que pode ter sido explorado muitas vezes antes.

Temas universais têm o poder de capturar a imaginação do público, provando que as questões fundamentais da existência humana são, em última análise, as que mais nos movem e nos unem.

Com o tema definido e a premissa definidos, o próximo ingrediente do Best-Seller, que abordaremos na parte II, é a construção de um enredo cativante.

Exercício: Conectando Tema, Premissa e Conflito Principal em Sua História

Deixo você com um exercício com o objetivo de te ajudar a gerar ideias de temas para um livro e, em seguida, conectar esses temas a uma premissa sólida e ao principal conflito da trama.

1 – Gere Ideias de Temas

Escreva uma lista de 10 palavras-chave que você considera interessantes ou importantes.

Podem ser emoções (amor, ódio), conceitos sociais (justiça, igualdade), ou qualquer outra coisa que venha à mente, como liberdade, vingança, opressão, etc.

A partir da sua lista, escolha uma palavra ou conceito que mais te intrigue ou inspire.

Esta será a base do tema do seu livro.

Por exemplo, se você escolheu liberdade, um tema universal seria o confronto de um ser humano rebelde com uma sociedade hostil.

2 – Conecte o Tema a uma Premissa

Em uma ou duas frases, defina o que esse tema significa para você.

Por exemplo, “Liberdade é a capacidade de agir conforme o próprio julgamento, sem restrições externas“.

Crie uma pergunta temática, ou seja, transforme seu tema em uma pergunta aberta.

Por exemplo, a pergunta poderia ser:

O que uma pessoa está disposta a fazer para conquistar sua liberdade?”

Desenvolva a premissa para a sua história.

A premissa deve ser uma afirmação ou situação que será o ponto de partida do seu enredo:

Um escravo em uma colônia distante descobre um plano secreto para uma revolta e deve decidir se junta à causa ou protege sua família.”

3 – Conecte a Premissa ao Conflito Principal

Com base em sua premissa, identifique quem será o protagonista e o antagonista na sua história.

Na premissa de exemplo, podemos ter o escravo como protagonista e senhor do engenho como o antagonista.

Ou, por um ângulo totalmente diferente, o antagonista poderia ser um outro escravo, companheiro do protagonista.

Em seguida, descreva os conflitos externos potenciais.

Um exemplo seria a logística da revolta, porque planejar e executar uma revolta não é tarefa fácil.

O protagonista e seus aliados enfrentam vários obstáculos, como conseguir armas, coordenar ações, e manter o plano em segredo.

No caso, se a revolta falhar ou for descoberta, as consequências serão severas. 

Isso inclui punições físicas, separação de famílias e, no pior dos casos, execução.

Depois de definir o conflito interno, descreva os possíveis conflitos internos do protagonista:

Pode ser um dilema moral intenso: o escravo coloca sua família em risco ou mantém sua lealdade à família e permanece em sua condição de escravo?

Os conflitos entre medo e coragem, entre esperança e desesperança também costumam render boas tramas nessa premissa.

Por fim, certifique-se de que o conflito esteja diretamente relacionado à pergunta temática e à premissa que você desenvolveu.

Você faz isso respondendo à pergunta temática:

O conflito central explora diretamente o que o protagonista está disposto a arriscar para conquistar sua liberdade.

Após concluir este exercício, você terá uma ideia sólida de como o tema, a premissa e o conflito da sua história estão interligados.

Isso servirá como um excelente ponto de partida para o desenvolvimento do seu enredo e personagens.

Adoraria ouvir você e sua experiência sobre temas.

Quais livros você considera exemplares em termos de tema?

Compartilhe suas opiniões nos comentários abaixo.

Sua participação enriquece a conversa e ajuda novos escritores.

33 maneiras de escrever histórias aclamadas pela crítica e adoradas pelos leitores.

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1 comentário em “Anatomia de um Best-Seller: Parte I – Tema”

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